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Especialistas discutem razões para afastamento dos cidadãos da política

Nas últimas eleições presidenciais brasileiras, em 2010, a abstenção eleitoral cresceu pela primeira vez desde 1998. A taxa de 18,12% é inferior à média registrada nos últimos 16 anos (18,53%), mas quebrou a tendência de comparecimento eleitoral crescente que o Brasil vinha experimentando nas décadas anteriores.
Para especialistas, porém, esse número não é motivo de preocupação. Segundo Manoel Leonardo Santos, professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma abstenção de até 20% não chega a ser sinal de problemas em uma democracia.
— A política não interessa a todo mundo mesmo, não. Isso é natural. Mesmo em democracias altamente consolidadas a participação não é total — minimiza ele.
Santos acredita que o país passa por um momento de afastamento dos cidadãos em relação à política, o que teria culminado nas manifestações de rua de junho de 2013.
— Tivemos um evento incomum, onde um forte sentimento antipolítica foi repercutido. As pessoas reagem a isso. Acho que esse é um problema residual. A partir do momento em que o debate vá se aprofundando, as pessoas se envolvem mais — acredita o professor.
De acordo com Acir Almeida, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), essa tendência de distanciamento dos eleitores pôde ser registrada em diferentes países em tempos recentes.
— O engajamento das pessoas tem aparentado declínio mesmo nas democracias mais consolidadas. É um padrão internacional, mas ainda não há explicação consolidada para isso — observa.
Santos e Almeida participaram do 1º Seminário de Estudos e Pesquisas no Poder Legislativo, promovido pelo Instituto Legislativo Brasileiro (ILB). A instituição funciona como centro de estudos, destinado tanto à qualificação dos servidores do Senado quanto a atividades de educação à distância, várias das quais abertas a todos os brasileiros.

O porquê da abstenção

Os motivos que levam o eleitor a não votar são tão desconhecidos para estudiosos da Ciência Política quanto os que o impulsionam às urnas.
— As razões que movem o eleitor são uma esfinge. Por que as pessoas votam quando sabem que sua possibilidade de influenciar o resultado é ínfima? Votam por algum sentimento de pertença, ou porque acham importante a democracia, e uns votam só porque é obrigatório — avalia Santos.
A obrigatoriedade do voto é, por razões óbvias, apontada como o principal motor da participação eleitoral no Brasil. Almeida, porém, não acredita que ela conte a história toda.
— Voto obrigatório significa comparecimento obrigatório. Se você vai pensar no seu voto é outra história. É importante ter essa distinção em mente — salienta o pesquisador do Ipea.
Um fator de peso que ainda restringe a dimensão da participação eleitoral no Brasil, segundo Almeida, é o estabelecimento ainda recente de eleições regulares e abertas no país.
— O que falta, no caso brasileiro, é tempo. Nossa experiência democrática ainda é recente, e a constituição de laços fortes [dos partidos] com o eleitor demanda tempo. Esperar que tenhamos o mesmo grau de politização de eleitores europeus, por exemplo, não faz muito sentido.

Ausência que incomoda

Almeida enumera uma série de fatores que se juntam para manter o eleitor em casa no domingo de eleição.
— Características das regras eleitorais, educação, aspectos socioeconômicos... No Brasil, temos diferenças regionais muito grandes e é natural que haja taxas diferenciadas por causa dessas diferenças. Isso tirando as variáveis de natureza político-eleitoral — lista ele.
As diferenças regionais geram um fenômeno que o professor Manoel Leonardo Santos classifica como grave: os índices de abstenção são maiores nas regiões mais carentes do país, onde os eleitores têm menor renda, pior nível educacional e menos acesso à informação.
Essa análise é corroborada pelos dados. Dos dez estados com maior média de abstenção eleitoral entre 1994 — primeiro ano disponível na série histórica do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — e 2010, sete aparecem entre os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, segundo o estudo mais recente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
— Quem menos participa são aqueles que mais precisam participar. A falta de envolvimento político de setores menos favorecidos da sociedade acaba reproduzindo as desigualdades e deixando essas pessoas de fora do processo — alerta o professor.

Voto obrigatório

O Brasil é um dos 22 países no mundo em que o voto é obrigatório. A enorme variação das taxas de abstenção entre essas nações, entretanto, indica que fazer da participação eleitoral um dever não é garantia de presença maciça ou de afastamento político.
A taxa brasileira de 18,12% de ausentes está bem abaixo da média desses 22 países se consideradas apenas as eleições mais recentes em cada um deles: 25,09%. A média apenas dos países latino-americanos também supera a estatística brasileira: 25,01%. Incluem-se aí, além do Brasil, Bolívia, Uruguai, Peru, Equador, Argentina, Panamá, Costa Rica, Paraguai, México, Honduras e República Dominicana.
Os extremos dessa lista de 22 mostram as diferenças possíveis dentro de sistemas eleitorais semelhantes. Países como Bolívia, Austrália, Cingapura e Luxemburgo não chegaram a 10% de abstenção em seus últimos pleitos. Por outro lado, as taxas chegaram a ultrapassar a casa dos 30% (Grécia, México), 40% (República Dominicana) ou mesmo 50% (Tailândia).
Os especialistas consultados veem o Brasil num bom patamar de participação política.
— O eleitorado brasileiro é politizado, sim. Boa parte da população se entusiasma na época de eleição — acredita Acir Almeida, do Ipea.
— Há uma multiplicidade de ideias e de representação política Brasil afora, e espaço para a discussão de temas variados — completa o professor Manoel Leonardo Santos.
Agência Senado

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