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Amy Winehouse, vida e morte por Eraldo Galindo Silva

Gente , quero apresentar a vocês um texto do professor Eraldo Galindo Silva que é filósofo e teólogo e que escreve textos magníficos , repletos de uma visão arguta, inteligente e por vezes cortante , mas magníficos. 
Tenho certeza de que você irão apreciar.

Amannda Oliveira


Amy Winehouse, vida e morte
Eraldo Galindo Silva

CARPE DIEM, “viva o instante!” – esta poderia ser a máxima que traduziria à perfeição a vida de Amy. “Ars longa, vita brevis” (a arte é longa, a vida é curta). Grande arte (revivendo o brilho das divas da história da música mundial). Sonora voz a desafiar o silêncio, ruído melodioso a clamar por um sentido para um mundo sem sentido. Vida intensa, louca, fulgurante como estrela, melancólica qual crepúsculo. Uma vida feita de “som e fúria” shakespearianas.

Amores? Fugazes. Família? Desencontros e reencontros. Amigos? Encontros e despedidas. Lugares? Chegadas e partidas. O sentimento do não-pertencimento a nada (e o desejo mal disfarçado de a tudo pertencer). Crenças? Buscas por atalhos sombrios (e promessa de alguma luz).

Amy trazia no corpo tatuagens que, se lidas numa perspectiva de possível deciframento psicológico dos seus desejos mais íntimos, muito revelariam das pulsações básicas do seu ser. No braço direito um pássaro, e a frase: “Nunca amarres as minhas asas”. Que sede de liberdade tal pedido expressa? No braço esquerdo, em comovente evocação, um símbolo que representa a sorte. Como ela precisou da sorte a vida inteira, sobretudo nos momentos cinzentos da sua frágil e breve existência!
Nadou contra a corrente, escandalizou os padrões morais convencionais, detestou os grilhões da hipocrisia, abominou a “normalidade” pequeno-burguesa imposta como regra comportamental e atitudinal dos “politicamente corretos”. Buscou a construção do próprio caminho, mesmo trilhando atalhos que a conduziram a crises, desassossegos, vias inóspitas e escolhas tortuosas de uma vida conturbada e oscilante. No fim, todos os caminhos a levaram ao nada. Desse nada emerge o mistério de Amy: essa luz que brilhou por fugazes momentos iluminou algum recanto do mundo? Tocou o coração de alguém? Trouxe beleza à vida humana no planeta terra? Essa luz se extingue ou se transmuta como energia imorredoura?  

Amy foi uma diva no sentido clássico do termo. Reencarnou grandes nomes da música pop internacional, aparentando-se, especialmente, com as grandes vozes femininas do soul e do jaz. Tradicionalmente as divas são reconhecidas como cantoras singulares: Maria Callas e sua voz ímpar; o canto pungente e a vida sofrida de Edith Piaf e Billie Holiday; a tragicidade musical de Judy Garland mergulhada no alcoolismo.

Curiosamente faz parte de um cortejo de artistas mortos aos 27 anos de idade, em plena primavera da vida: Kurt Cobain do Nirvana, Brian Jones dos Rolling Stones, Jim Morrison de The Doors, Janis Joplin, Jimmy Hendrix... Amy reviveu contemporaneamente, há de se supor, uma tradição romântica que remonta ao alvorecer do século XIX, visão que tem suas ressonâncias no tempo presente: “o artista deveria, necessariamente, ser um rebelde e marginal, guiado apenas por suas emoções, insubmisso às regras sociais que regem a vida dos mortais comuns. As marcas de seu gênio seriam o isolamento, a incompreensão, a melancolia e o desespero. Nada mais heróico do que confrontar a degeneração física e a morte. Nada mais bonito do que morrer jovem”.

Winehouse talvez tenha escolhido morrer como forma de bradar seu último “não” à vida (na forma material que esta vida assumiu no seu tempo – tempo por nós sofregamente compartilhado). Pode ter compreendido, em algum recanto íntimo do ser, que seus 27 anos fora uma escala de tempo suficiente para gritar ao mundo as emoções, dores e tristezas que habitavam seu universo interior. E, numa contradição dialética existencial, em meio a escombros ergueu sua potente voz, desfilou sua imagem atípica, abriu seu sorriso há um mundo cheio de desencantos. De fato, sua voz poderosa denotava uma infinda dor. Na sua radical humanidade, de alguma forma se conectava com o divino. E esta voz, arrebatadora, de repente se fez silêncio.

Seu amigo Russel Brad resumiu de forma plangente as expectativas que Amy lhe causava: "Quando você ama alguém que sofre da doença do vício, você espera o telefonema. Haverá um telefonema. A sincera esperança é que a ligação seja dos próprios viciados, dizendo que já se cansaram, que estão prontos para parar... Porém, você teme a outra chamada, uma triste ligação noturna de um amigo ou parente dizendo que era tarde demais, ela se foi”.

Se Amy teimar em nos enviar uma nova canção lá dos espaços infinitos onde se encontra, teremos ouvidos atentos e sensíveis para ouvirmos novamente a sua voz? 


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5 Comentários

  1. Excelente, texto, muito bom.

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  2. Extraordinário este texto sobre Amy Winehouse!
    Parabéns!

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  3. Esse camarada escreve bem prá caramba, e fala melhor ainda. É um coroa com a cabeça bem leve, mais do que muitos jovens/velhos de hoje.

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  4. Esse é o meu professor historiador e filósofo, peço a dona do blog que publique outros texto dessa fera.

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  5. Este blog tem espaço aberto para bons escritores. Sempre que ele quiser terá espaço aqui para publicar seus textos.

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